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O melhor de dois mundos: direitos de ciclistas, deveres de peões…

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O melhor de dois mundos: direitos de ciclistas, deveres de peões…

Um artigo recentemente publicado no Expresso dava conta de (mais) uma reivindicação de alguns utilizadores das bicicletas (desculpem, mas, para mim, o termo ciclista implica uma outra dignidade e nobreza), supostamente representantes de um universo mais vasto, que, pela sua soberba, só poderá servir como argumento final para todos quantos têm vociferado contra os novos direitos que lhes foram conferidos pela mais recente revisão do Código da Estrada.

A propósito da sinistralidade, nomeadamente nos acidentes que envolvam veículos motorizados e bicicletas, e das responsabilidades que caibam a cada uma das partes, a maior pérola que por lá se pode encontrar é a defesa de que, nesses casos, os estragos devem ser sempre pagos pela seguradora do veículo motorizado, mesmo que o causador do acidente seja o utente da bicicleta, e mesmo que tal implique o agravamento do prémio de seguro.

Para suportar esta sua exigência, as associações de ciclistas invocam uma série de argumentos igualmente notáveis. Como o já existir uma norma desse género nalguns países europeus – porventura naqueles em que os ciclistas que circulam na via pública cumprem as regras do trânsito, não passando sinais vermelhos a seu bel prazer, respeitando as regras da prioridade e não se fazendo passar por peões sempre que isso lhes é conveniente. Quem sabe não será também naqueles em que os automóveis, e tudo o que lhes está associado (como os seguros), não atingem os preços absurdos que são praticados em Portugal, e onde a educação e o civismo de TODOS é de uma outra dimensão.

Impossível resistir à tentação de aqui replicar mais umas quantas declarações desses dirigentes associativos para tentarem fazer valer o seu ponto de vista: o automóvel é uma “arma potencial”; “quem tem carta de condução tem de ter responsabilidades para com aqueles que não têm” (exacto, assim mesmo!…); se o seguro fosse obrigatório para os ciclistas “também teria de ser obrigatório para os peões, já que [estes também] atravessam a via pública e usam passeios”.

De facto, só esta última passagem dá uma ideia bastante concreta da forma como alguns utilizadores da bicicleta encaram o seu papel: direitos de veículos aptos a circular na estrada, responsabilidades de peões, o que não deixa de contribuir também para que se perceba alguns dos seus aberrantes comportamentos. Uma dúvida assolou-me, todavia: e se um ciclista atropelar um peão, quem deverá pagar os danos? Porventura, o veículo motorizado que, na altura, circule mais perto do sinistro…

No final, claro está, vem a ladaínha da praxe: “a utilização da bicicleta é boa para a saúde, ambiente e economia”. Algo que só poderá ser afirmado por quem não tem a mínima noção do quanto, mesmo com a crise actual, o sector do automóvel e dos transportes rodoviários contribui para a economia portuguesa.

Perante isto, é mais fácil perceber porque passou a estar tão em voga o novel termo “ciclofascista”; e que determinada argumentação em nada contribuirá, pelo contrário!, para o bom relacionamento entre uns e outros. Igualmente evidente, as alterações introduzidas pela revisão do CE, neste particular, não só pecam, nalguns casos, por serem contraproducentes, como, globalmente, nunca deveriam ter ganho letra de lei antes de uma campanha pública de sensibilização, formação e educação de todos quantos partilham a via pública. Se dúvidas houvesse…

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zyrgon