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Combustíveis simples – do mito à realidade

Artigo
Combustíveis simples – do mito à realidade

Face às múltiplas declarações que inundam os OCS, apregoando os amplos benefícios resultantes da obrigatoriedade de comercializar combustíveis simples em todos os postos de abastecimento, resolvi reconsiderar a minha intenção de não voltar a abordar este tema. É que, devido à minha forma de ser, custa-me assistir de braços cruzados a tanta informação sobre os pretensos benefícios e poupanças que terão resultado desta medida. Tentar justificar o injustificável é uma prática bem conhecida e que, infelizmente, acaba por criar uma nebulosa em torno da realidade, que leva o público, não especialista, a acreditar nalgumas das mensagens que são sistematicamente repetidas até à exaustão.

A minha opinião sobre a inutilidade desta lei, para além da sua falta de equidade, não me impede de tentar enxergar os tais aspetos positivos que se teima em difundir. E quais são, então, os argumentos difundidos pelos autores e pelos defensores desta medida. Têm-se situado a dois níveis: a qualidade dos produtos e a poupança para os consumidores.

Sobre o primeiro, assiste-se a uma campanha que levaria os menos informados a pensar que só agora passámos a ter disponíveis, produtos de qualidade, obedecendo a todas as especificações europeias e nacionais. Implicitamente está a dizer-se que isso não aconteceria no passado, com os produtos aditivados pelos principais operadores do mercado. Mas onde está a sustentação para tais afirmações / insinuações? Em que é que os produtos que, por força da lei, foram retirados do mercado, não respeitavam na totalidade essas normas e especificações? A verdadeira resposta é: não só respeitavam como as ultrapassavam, com todos os benefícios já explicados em artigos anteriores. Para além disso, pretende-se também fazer crer que só agora se controla a qualidade, acusando indiretamente as instituições que tinham a seu cargo essa incumbência, de não o fazer. Eu sei que as organizações recém-criadas têm que justificar a sua existência e marcar terreno e posição, mas não precisam de falar como se antes delas nada existisse. Esta questão da qualidade é, pois, um mito que se quer criar. A realidade é que a qualidade média dos combustíveis rodoviários líquidos à venda em Portugal sofreu uma redução, embora, e sempre o dissemos, não esteja em causa o cumprimento das normas e especificações que regem a sua comercialização.

Em relação à poupança, aparecem os mais variados valores, sendo o mais recente que os consumidores pagarão menos 3 c/l o que, multiplicado pelo consumo, daria uma poupança anual de cerca de 200 milhões de euros. Um valor não despiciendo, sem dúvida. Mas, como foi calculado? Onde está a evidência de que o que se vende hoje tem aquele diferencial para o que se vendia ontem? Tanto quanto nos é dado perceber, apenas um grande operador optou por comercializar os combustíveis simples, mantendo os que antes constituíam a sua gama base. Todos os outros optaram por os descontinuar. Por isso, a base de comparação é reduzida. E, mesmo neste caso, tanto quanto os dados publicados pela DGEG mostram, a diferença fica-se pelos 2 c/l. E obviamente que estamos a simplificar o método de cálculo: o aumento de consumo que advém da utilização de combustíveis não melhorados, como já tivemos oportunidade de explicar, elimina parcialmente aquela pretensa poupança. Isto sem falar nos outros custos e consequências negativas já referidas em artigos anteriores. Temos, pois, outro mito que é do valor e da poupança para os consumidores, quer porque a realidade não permite aquele cálculo, pelo menos com o carácter de rigor com que pretensamente é formulado, quer porque se ignoram outros fatores relevantes que pesam negativamente no balanço total.

Finalizarei com a constatação que nivelar por baixo parece ser um desígnio muito apreciado. E como consumidor, gostaria muito que me deixassem fazer as minhas escolhas e dispenso um Estado intervencionista que acha que sabe aquilo que eu quero.

António Comprido
Secretário-geral da APETRO

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