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O novo Gulag

Artigo
O novo Gulag

Para trabalho igual, salário igual”. A frase ou o “ideal” subjacente é muito querido aos meios da extrema-esquerda política. Ingenuamente, eu pensava que já tivesse evoluído para algo mais universalista, como por exemplo “igualdade de oportunidades”. Parece que não. Ouvia-a recentemente “vociferada” por um médico, mais propriamente pelo bastonário da respetiva Ordem.

O conceito implícito naquele “ideal” não é, na minha opinião, nada socialista nem sequer de vanguarda. Ele limita-se a pensar pessoas como máquinas, quais autómatos. Como se todas as pessoas, que exercem uma mesma profissão, função ou tarefa fossem iguais e o desenvolvessem de forma igual e com os mesmos resultados.

É aliás um conceito bastante retrógrado, originário do início do século passado, e que esteve na base de regimes que tentaram moldar as pessoas como autómatos e que, com exceção da Coreia do Norte (ainda), implodiram, entre outras razões, por assim atuar.

Enquanto humanos somos todos diferentes, pensamos e temos diferentes perspetivas sobre os mesmos temas e é nessa diversidade cultural e de conhecimento que reside parte da riqueza potencial e real das equipas de trabalho, desportivas, culturais, enfim em sociedade.

Esta questão levantou-se-me ao assistir atónito, à aprovação no Parlamento e em velocidade recorde – sem qualquer discussão pública, afinal só própria das democracias evoluídas e maduras – do diploma que eliminou o exame obrigatório de Português e Matemática do 4º ano.

Fortemente apoiada no Parlamento pelo PCP e pelo BE, a fundamentação assentou essencialmente em três premissas:

  1. Acabar com a angústia dos pequenos gaiatos;
  2. Dar ou devolver aos professores o poder decisivo da avaliação dos mesmos;
  3. Em escolas diferentes (leia-se em ambientes sociológicos distintos) deve haver programas pedagógicos adaptados e por isso diferentes.

Já não irei tão longe como afirmar que se visou agradecer os apoios dos sindicatos dos professores e indiretamente às respetivas centrais sindicais. Ou que se visou o facilitismo com a consequente melhoria das estatísticas futuras do ensino em Portugal, fruto de uma nova e melhorada governação neste sector. Também não vou debruçar-me sobre a ansiedade dos miúdos, nem na subjetividade da avaliação dos professores, pois como humanos são todos diferentes, tanto como os seus critérios. Apenas irei refletir um pouco sobre a terceira premissa (ou preconceito?).

Centro-me num argumento sublime usado na discussão Parlamentar que mais me deixou incrédulo, em suma: “As escolas de alunos ricos podem e devem ser mais exigentes e escolas com alunos mais pobres devem ser mais tolerantes, nos seus programas e avaliação…”. Em prol dos mais desfavorecidos, não posso aceitar tal argumentação, este julgamento!

Acredito que esta estranha forma de ser esquerda, apenas significa a condenação à pobreza perpétua quer intelectual, de liberdade e de oportunidades dos que nascem em berços mais desfavorecidos, afinal os únicos inocentes. Nasci de ventre humilde. Trabalhei de dia e estudei mais de dez anos à noite. Dormi cerca de 5 horas por noite e passei muitos fins-de-semana a ver os meus amigos saírem para se divertir, ficando a estudar. Nunca me resignei e sempre lutei, da mesma forma como tive (toda a minha geração) de enfrentar o primeiro “tribunal” que no final dos anos sessenta representava uma sala de Exames da Quarta Classe. Nunca me senti minimizado ou traumatizado por isso ou pela dura exigência. Tive assim liberdade de aproveitar as oportunidades profissionais que desejei e descartar outras. O “Sistema” não me condenou à partida a ser pobre toda a vida e julgo que parte do meu sucesso profissional resultou dos meus professores não me terem facilitado mais a vida do que aos “queques da Lapa”, quando ao lado deles estudava no então Liceu Normal Pedro Nunes ou depois no ISEG.

Facilitar a vida dos alunos mais desfavorecidos é incutir-lhes uma atitude de complacência perante os obstáculos futuros, reduzir-lhes o desenvolvimento da capacidade de trabalho, da exigência consigo e da autoconfiança perante os mais favorecidos, também eles inocentes. Sem discussão pública, é condenar a maioria daqueles pequenos inocentes a uma vida adulta de fracassos, limitando-lhes as competências em transformarem ilusões em objetivos ambiciosos e em concretizações de sucesso. É gerar novos autómatos, na maioria dos casos, sem horizontes largos e incapazes de competirem lado a lado nos mercados globais de trabalho, empresarial ou simplesmente em sociedade.É simplesmente condicionar-lhes as oportunidades, liberdades e dignidade.

Um Parlamento dito vanguardista, acaba de condenar a maioria dos nossos pequenos mais desfavorecidos à “ilha da miséria e da vergonha”. Mas que raio de democracia é esta que prepara um novo Gulag, no silêncio dos inocentes?

Mário Lopes

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Mário Lopes